quinta-feira, 14 de abril de 2011

Formação do Leitor

“Saber ler não é suficiente para transformar uma nação. É preciso ler mais. E leitores são formados, basicamente, com literatura. Isso porque a literatura é a palavra expressa em arte, alimento essencial do imaginário.”  Elizabeth Serra


Ana Paula Maranhão

Ao longo dos anos, muito vem se falando da importância da formação do leitor, mas pouco se tem feito no sentido de instrumentalizar pais e professores, no que diz respeito ao desenvolvimento do gosto pela leitura. Visto que o ato de ler não visa só a formação acadêmica da criança, mas a sua formação como cidadã.

Trabalhar com formação do leitor passa inevitavelmente pela leitura de livros, de imagens e do seu cotidiano com seu acervo cultural, que lhe dará visão de mundo.

Desde pequena, a criança escuta histórias narradas por sua mãe, seu pai ou seus familiares mais próximos. Elas são passadas de geração a geração, chegando aos seus ouvidos como um presente de amor, como bem dizia Lewis Carol, escritor de Alice no País das Maravilhas, ao comentar sobre os contos de fadas.

Os contos de fadas, as fábulas, as histórias bíblicas, os poemas, as anedotas ou até as histórias inventadas pelos seus pais carregam o poder de encantar e deslumbrar a todos os que os ouvem.

É ouvindo que podemos sentir emoções importantes na vida, como: tristeza, raiva, irritação, medo, alegria, segurança, insegurança, irritação, bem-estar, pavor, tranqüilidade, liberdade, entre muitas outras sensações.

As histórias podem ajudar o leitor porque, em vez de apresentar conselhos num embrulho bem-feito, elas abrem um caminho para uma discussão. Como ressalta Bruno Bettelheim, as histórias ajudam a criança leitora a explorar os perigos do mundo num nível simbólico, não oferecendo regras simplistas ou enigmáticas, mas encorajando-a a confiar e a desenvolver seu sistema natural de proteção, seus próprios instintos, suas emoções.

Através das nossas emoções, formamo-nos como seres pensantes, capazes de estabelecer pontes entre o possível e o imaginário (se for trabalhado). Proporcionando um conhecimento sobre os nossos problemas interiores e nos tornando capazes de estabelecer relações entre nossos sentimentos.

Para uma história chamar a atenção de um leitor, ela deverá ter componentes que despertem principalmente a sua curiosidade e imaginação, desenvolvendo, em primeira instância, o seu intelecto como um ser envolto de sentimentos e emoções. Deverão ser apresentadas de maneira simples, divertida, sem solicitações ao leitor, sem preceitos ou normas, mas através de retratos feitos com palavras.

Antes de aprender a ler, a criança leitora precisa fazer uma idéia do que é a leitura. Como é que ela pode abordar a leitura sem compreender que espécie de objeto é um livro e que texto escrito transcreve a linguagem? Não se pode ter o desejo de ler sem saber o que é isso. A leitura feita pelas pessoas que rodeiam a criança desenvolve nela o desejo de ler por si mesma, tão irresistível quanto o desejo de começar a andar sozinha.

Para isso, precisamos ter nossas escolas cúmplices desse desejo, ou melhor falando, desse prazer. Seria impossível falar de prazer para quem nunca o experi-mentou. De onde se conclui que pais e professores sem prazer não podem formar bons leitores.

Então como poderíamos formar leitores com prazer?

O primeiro passo seria a audição de livros, sabendo que esta é um dos primeiros sentidos a se desenvolver no homem. O feto com quatro meses já tem apurado o seu senso auditivo. E é através dele que as funções cognitivas, lingüísticas e afetivas irão se desenvolver.

No nível cognitivo, ela abre uma janela para o conhecimento que a observação sobre atividades cotidianas não consegue comunicar, permitindo estabelecer associações esclarecedoras entre a experiência dos outros e a sua própria. Provocando assim a compreensão dos fatos e dos atos, organizando-os melhor, retendo informações e elaborando roteiros com seus esquemas mentais.

Formação de Leitores

No nível lingüístico, a audição de livros permite esclarecer um conjunto variado de relações entre a linguagem escrita e a linguagem falada; o sentido da leitura; as fronteiras entre as palavras; e a recorrência das letras, dos sons e da pontuação utilizada, aumentando a estrutura de seu repertório e desenvolvendo estruturas de frases e textos. A criança leitora habitua-se a parafrasear, a dizer de outro modo, a compreender e a utilizar figuras de estilo.

Essas capacidades lhe serão particularmente úteis após os dois primeiros anos de aprendizagem da leitura, durante os quais os textos a serem lidos são ainda relativamente simples. Com efeito, os conhecimentos lingüísticos adquiridos durante a audição de livros (histórias) proporcionam-lhe um trunfo considerável para enfrentar uma leitura progressivamente mais sofisticada.

No nível afetivo, descobre-se o universo da leitura pela voz, pela entonação e pela significação daqueles em que a criança tem mais confiança e com quem ela mais se identifica. Através de suas histórias favoritas, seus pais e professores desempenham um papel importante com seus comentários e suas explicações. Frutificando os subsídios cognitivos e lingüísticos, sendo através deles que o leitor descarrega todas as suas emoções e seus sentimentos, sempre lhes dando um novo significado. Desse modo, ele irá perceber a função social da leitura.

Formar um leitor é algo sutil e democrático, exigindo a única pedagogia possível: a do afeto e da liberdade (Maria Dinorah,1996).

Segundo estatísticas internacionais, forma-se um leitor mais ou menos até os quatorze anos de idade, num processo que tem raízes no lar, onde a criança, desde os primeiros anos de vida, convive com a magia das histórias, lendas, poesias... Especialistas chegam a afirmar que esse processo tem início no ventre materno. Aprendendo a gostar de ler, antes mesmo de saber ler.

José Morais, em seu livro A arte de Ler, afirma que “Os prazeres da leitura são múltiplos. Lemos para saber, para compreender, para refletir. Lemos também pela beleza da linguagem, para nossa emoção, para nossa perturbação. Lemos para compartilhar. Lemos para sonhar e para aprender a sonhar (há várias maneiras de sonhar...). A melhor maneira de começar a sonhar é por meio dos livros...”

Deduzimos então, como Maria Dinorah, professora e escritora, que “Uma criança sem livros é um prenúncio de um tempo sem idéias”. Para ela, o livro tem o poder de desenvolver na criança leitora a criatividade, a sensibilidade, o senso crítico, a sociabilidade e a imaginação; e leva a criança a aprender. É lendo que se aprende a ler, a escrever e a interpretar, formando assim um verdadeiro leitor, leitor no mundo que o rodeia. Numa palestra, Emília Ferreira falava: “Contem muitas histórias para as crianças, desde pequeninas”. Bill Gates, o papa da computação, em entrevista ao Jornal do Brasil de 15 de dezembro de 1996, revelou: “Computadores não substituem livros”. Cecília Meireles citava: “A literatura melhor é a que as crianças lêem com prazer”. Assim falava Fanny Abramovich: “Ah, como é importante para a formação de qualquer criança ouvir muitas, muitas histórias”. Monteiro Lobato, que desejava muito fazer “um livro onde as crianças pudessem morar”, também comentava: “Um país é feito de homens e livros”. Percebemos em todas as citações o quanto é encantador proporcionar o prazer pela leitura.

Para formarmos leitores, precisamos ter prazer; o prazer da audição, de se encontrar consigo mesmo, de ser ator e espectador, mesmo que ela ainda não saiba ler. Daniel Pennac, em seu livro Como Um Romance, revela-nos os dez direitos imprescritíveis de um leitor:

01. O direito de não ler.

02. O direito de pular páginas.

03. O direito de não terminar um livro.

04. O direito de reler.

05. O direito de ler qualquer coisa.

06. O direito ao bovarismo (doença textualmente transmissível).

07. O direito de ler em qualquer lugar.

08. O direito de ler uma frase aqui e outra ali.

09. O direito de ler em voz alta.

10. O direito de calar.

É importante que esses direitos estejam incorporados às práticas cotidianas do leitor, propiciando-lhe informações culturais e oportunidade de se apaixonar pelas leituras e pelos livros, dando alimento à sua imaginação. Proporcionando o máximo de conforto e liberdade, pretende-se despertar o desejo e o prazer de ser um verdadeiro leitor.

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