quinta-feira, 9 de setembro de 2010

Livros que puxam outras histórias

Cristiane Rogerio

Ler um livro é mesmo como puxar um novelo de lã. Mas eu penso mais como um novelo de lã que está amarrado a outro novelo, de outra cor, que por sua vez está enganchado em outro, e em outro, até ir nesse embalo para sempre.

Uma história puxa outra. A gente lê uma frase e lembra de outra em outro livro. Ou lembra de um livro do mesmo escritor ou ilustrador. E corre para a estante, doido de vontade de rir de novo ou emocionar-se com a releitura. É como ouvir uma boa música no rádio: você é pego pela memória que transporta você a outro momento da vida, ótimo para mergulhar na lembrança. Acontece comigo o tempo todo. E isso só é possível por termos referências. E as referências só ocorrem quando temos oportunidades.

Tive esta reflexão lendo o A Cicatriz, o novo livro do escritor Ilan Brenman, ilustrado pela Ionit Zilberman e lançado pela Companhia das Letrinhas. Ilan conta a história de uma menina que levou um tombo, preciso ir ao hospital levar pontos e, claro, ganhou uma bela de uma cicatriz. Poderia ser apenas um relato de cotidiano, mas por meio da cicatriz a menina descobre que outras pessoas que ela conhece também carregam cicatrizes e, que – lembrem-se todos! – cicatrizes são o quê??? HISTÓRIAS!

A gente tem por cultura dar peso às palavras. Minha mãe, por exemplo, não me deixava pronunciar nem a palavra “maldita”, nem a “inveja”. Cicatriz é uma destas que têm um peso pelo significado que nos carrega, nos transmite. A filha de um amigo meu ao invés de dizer “cicatriz” dizia “cicatriste”! A palavra vem da dor. Mas a dor traz também a história, a maturidade, a experiência. O mais bonito desse livro é ver a menina indo atrás das histórias das cicatrizes das pessoas e dar valor a isso. Porque uma história puxa outra, que puxa sentimento, puxa referência, opinião, conversa. É para isso que livro está entre nós. Para ficarmos juntos, o mundo todo, por suas histórias.

Cristiane Rogerio é editora de Educação e Cultura da Crescer e adora se perder entre os livros.

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