sábado, 19 de junho de 2010

Como cultivar o hábito da leitura nos filhos

Josué Ebenézer de Sousa Soares

Ler é uma aprendizagem. Quem não freqüentou esta escola, passa longe dos jornais, revistas e livros, e reclama que tem muito papel espalhado pela casa e pela vida. Sua preocupação com as árvores não é ecológica, mas apenas lógica. A lógica da lei do menor esforço. Meu pai já dizia quando esbarrava com alguém tomado pela preguiça Este aí só quer sombra, água fresca e jornal sem letra... Claro; para não cansar as vistas! A leitura, como aprendizagem, começa cedo e se estende por toda uma vida; não cessando nunca, nem com a morte.

Se ainda não inventaram este personagem, deixa comigo, mas deve haver algum defunto-leitor nas páginas literárias do mundo, que gaste parte de seu tempo ocioso no caixão, a procurar as etiquetas do forro, ou a marca de fábrica na madeira, enquanto o tempo escorre lentamente na ampulheta do além, à semelhança de certa gente que, em vida, não perde tempo para o vazio, fazendo do ócio tempo de leitura, nem que seja de rótulo de sabonete, xampu ou desodorante, para passar o tempo das idas ao banheiro.

Deixando as digressões literárias de lado, vamos concluir que ler é uma questão de dedicação ao fato. Aprende a ler, quem lê. E lê bem, quem lê muito. E aprende a falar e a escrever, quem investiu parte da vida na leitura. O lector medieval não freqüentava escolas, porque escassas eram, mas lia. E lendo, muita gente se fez inteligente. O autodidata tem esta vocação para a leitura, que o torna um ser em transição para aquilo que o novo livro lido fará dele após o tempo gasto em seu exame. Por isso alguém já disse: Somos o que lemos!

Mas como incentivar as novas gerações a amarem a leitura? Como legar aos que nos sucederão na trajetória da vida o gosto pela leitura e, conseqüentemente, pela escrita? Esse é o desafio que pais e educadores enfrentam, mormente nos dias de hoje, quando a televisão, a máquina de fazer doido, se constitui num instrumento de emburrecimento precoce de nossa infância, impondo com sua programação inócua e bizarra - onde a falta de criatividade e a mesmice preenchem as manhãs, tardes e noites de nossa gente -, certa nivelação, por baixo, de nossa inteligência.

Aprendendo a gostar de ler pelo exemplo

Ninguém nasce gostando de ler, como ninguém nasce gostando de tomar banho, principalmente no inverno. Somos educados para certos hábitos e nos identificamos com certas necessidades que vamos descobrindo ao longo da nossa existência. As famílias precisam investir na leitura, incentivando seus filhos a lerem o máximo que puderem.

Numa casa onde se encontra de tudo, menos alguns exemplares de livros, crianças não encontrarão o ambiente necessário para uma boa formação intelectual. O governo tem criado programas de incentivo à leitura, e até mesmo forjado pacotes literários como se fora uma cesta básica literária para colocar nas mãos das crianças em idade escolar da rede pública.

Tais incentivos esbarram na falta de exemplo dentro do lar. Com certeza, a escassez de livros numa casa será recompensada pela qualidade do interesse de pais que demonstrem gosto pela leitura, e o pouco que tem para ler, o fazem com sofreguidão. Se crianças esbarram com pais que, volta e meia, estão com livros na mão, compulsando-os avidamente, terão seu interesse despertado para saber o que há de tão cativante em tais livros que prendem tanto a atenção de seus pais. (Não resta dúvida que, neste caso, temos um compromisso sério com a qualidade do que lemos.)

Além do mais, desde cedo, pode-se forjar leitores, ao presenteá-los com livros em datas específicas do calendário social: aniversário, dia das crianças, Natal e outros. No lugar de certas quinquilharias que perdem o seu valor rapidamente, o livro como presente, constitui-se um bem durável, que se eterniza na memória do leitor, mas também se materializa na estante de seu proprietário, podendo constituir-se em bênção para tantos quantos a ele tenham acesso.

O exemplo de casa é, portanto, o principal incentivo para que, na tenra infância a criança já comece a ter interesse pela leitura. Investimento que se faça também em leituras coletivas de livros, interpretação de textos e serões semanais para se contar historinhas para as crianças serão de grande valia na formação do background literário de um ser. Para tanto, não há melhor instrumento de aprendizagem da leitura do que o culto doméstico. Neste espaço sagrado da devoção familiar, as crianças aprendem a gostar da leitura da forma mais edificante. A leitura da Bíblia é a porta que abre o caminho dos céus. E me refiro não só aos céus teológicos, mas aos literários, que podem fazer uma criança viajar nas asas da imaginação com as histórias bíblicas de José, Josué, Abraão, Jacó, Daniel e outros personagens bíblicos.

Aspectos práticos de incentivo a leitura

Além das idéias que foram esboçadas nestas primeiras linhas, gostaria de destacar algumas ações práticas que podem ser tomadas no seio da família para despertar o interesse pela leitura em seus membros. Apenas para síntese, concluímos que pelo menos três ações são elementares na formação de novos leitores: 1ª) Dar o exemplo para os mais jovens, sendo um bom consumidor de livros; 2ª) Promover oportunidades de leitura sadia no ambiente familiar, com troca de experiências e informações; 3ª) Presentear os entes queridos com exemplares de livros que possam contribuir para a sua formação moral e intelectual.

A construção de uma boa biblioteca familiar também será um tremendo incentivo à leitura no ambiente da casa. Crianças que aprendem a conviver com os livros desde cedo aprendem a amá-los e reverenciá-los como fonte de cultura e saber. Existe uma relação emblemática entre livro e leitor de modo que o ato de manuseá-lo constitui-se também em experiência táctil, afetiva, espiritual.

Na vida de cada ser existe o livro que gera a sua paixão pela leitura. É o livro gerador do leitor. É o livro que se faz pai, ao conceber idéias e sonhos na mente do leitor que está se descobrindo para o mundo das páginas literárias. Na minha vida, este livro foi A Irresistível Inimiga. Um livro de ação, ambientado em castelos franceses da época renascentista e que me prendeu do início ao fim. Era junior ainda, quando o li, embora fosse um calhamaço enorme. Tenho-o guardado em algum caixa de recordações...

Com o passar do tempo, outros livros e autores foram se aproximando e me conquistando. É interessante destacar também a relação que o leitor passa a ter com certos autores. Dostoievsky, Tolstói, Machado de Assis, José de Alencar, Cecília Meireles, Maiakóvsky, Wittiman, Manuel Bandeira, Jorge Luiz Borges, Gabriel Garcia Marques, Henry Thoreau, Marcel Proust, Hemingway, Mark Twain, Emily Brönte, dentre outros, foram ficando em minha vida na medida em que me iam sendo apresentados pelos seus escritos.

Além disso, cada ser deve ter o seu livro essencial. Ou seja, aquele livro que representa suas idéias, sua formação, seus sonhos e ideais. Para o cristão, a essencialidade deve ser encontrada na Bíblia, livro de cabeceira de quem quer que se pretenda sábio. Outros livros poderão ter espaço vital em nossa vida. Como livros se produzem às toneladas, é fundamental que se saiba escolher o que ler. Ser seletivo na escolha do que ler é o mínimo que se requer de um leitor moderno, para que não se veja metido a ler o que pouco vá acrescentar aos seus interesses espirituais e intelectuais.

A guisa de ilustração pessoal

Sempre gostei de ler. Não sei exatamente como e quando isto começou, mas devo, com certeza, aos meus pais (ele, pastor; ela, professora) este bom hábito. Costumo dizer que sou um amante das palavras, embora não tenha tanta certeza se elas são assim tão apaixonadas por mim.

Como, desde a infância lia - mas só comecei a escrever por volta dos treze anos, o que sempre imaginei tarde -, quis infundir nos meus filhos o gosto pela leitura. Além das vivências acima descritas, queria algo mais objetivo. O que fazer? Pensei, então, em dar um incentivo financeiro para que meu filho Lucas, quando estava com oito anos, lesse um romance. Peguei um romance evangélico, da JUERP (A Riqueza Maior de Jilton Moraes), e entreguei na mão do garoto. Não sei se o problema estava no livro, no método ou no menino, mas o fato é que o projeto gorou.

Não convencido pelo malogro, quando o menor, Murilo, completou os mesmo oito anos, repeti com ele a experiência: O mesmo livro, a mesma oferta. Deu certo. Em uma semana o garoto consumiu o livro.

- Pai, cadê o dinheiro? Já li tudo!

Fiquei boquiaberto!

- Filho, conta pra mim a história... Você gostou da leitura?

E Murilo descreveu o que lera, em detalhes que me surpreenderam. O que me chamou a atenção, não foi sua narrativa dos fatos da história do romance, mas sua interpretação dos acontecimentos, à luz do seu conhecimento bíblico.

Fiquei tentando encontrar uma explicação para a diferença de resultados. O problema ou o acerto não estava no livro, nem no método, mas na ambição. O segundo deixou-se estimular pela recompensa... Isto não quer dizer que a experiência não tenha sido válida. A forma com que ele absorveu o conteúdo, e os resultados que apareceram depois me satisfez. Digo o mesmo com o Lucas. Se ele não leu aquele primeiro, hoje é leitor inveterado.

O fato é que hoje - quando Lucas está preste a fazer 13 anos e Murilo, nove -, me surpreendo com os resultados já obtidos: Ambos estão no plano de leitura da Bíblia toda para este ano de 2005; Lucas está lendo bastante, já leu vários livros e está lendo agora uma série para a faixa etária dele e cobra sempre o dinheiro para trazer o novo exemplar da livraria; Murilo está aventurando-se na poesia.

Sobre este último assunto quero fazer alguns destaques. Tenho me surpreendido com alguns textos do Murilo espalhados pela casa, em papéis que ele usa para extravasar sua poesia latente. Frases como estas me emocionam: Quase todo amor se acaba. / Acaba-se o meu amor por uma menina / Ou outro amor. / Mas, o de Deus, por mim, não acabará! Fico imaginando o que se passa no interior desse meu pequerrucho; seus conceitos de Deus, amor e paixão... Mas, para um pai coruja que também é aficionado por poesia, sabê-lo interessado no tema me é motivo de orgulho.

Foi por isso que me sentei outro dia e pus-me a escrever este soneto, a ele dedicado:

A MUSA VISITANDO MEU FILHO

Meu filho, a Musa que te busca, e te faz escrever,
e faz parar o brinquedo, toda algazarra infante,
e te leva a espalhar, pela casa a todo instante
os papéis onde imprimes o que não podes deter.

É a Musa que acomete e toma conta daquele
que certo dia na vida viu algo além da matéria
e fez viagem nos sonhos de uma pureza etérea
amando um Universo que agora passa a ser dele.

Por isso, filho querido, assim que a Musa chegar
e em sua cabecinha sentir sonho se aninhar
e dentro, no coração, palpitar grande esperança!

Corre ágil para a mesa, toma caneta e papel
escreve logo um poema que anuncie seu céu
e deixe a alma fluir embalada de bonança!

O sucesso na escrita é decorrente do investimento na leitura. Não se constrói uma sociedade sem letras. Como disse Monteiro Lobato: Um país se constrói com homens, idéias e livros. Uma sociedade de iletrados não produzirá boas coisas senão aquelas mesmas decorrentes dos preconceitos e da obtusidade de seus integrantes.

Para concluir

Não é fácil ler em nossos dias. Vivemos a era da imagem. Tudo é imagem. Desde a garota que precisa se produzir para chamar a atenção; até o anúncio de qualquer produto na tevê, no jornal ou revista, no outdoor, tudo é imagem que precisa comunicar rápido. Os adolescentes abreviam palavras e comunicam de forma imprecisa como fez o filho do presidente Lula em janeiro, ao tentar justificar a festa dada para seus amigos adolescentes no Palácio do Planalto.

Numa sociedade apressada como a nossa, convencer nossos filhos à leitura é tarefa árdua, posto que nem mesmo a escola tem cumprido direito este papel. Mas, vale a pena. E o melhor método sempre será o exemplo. Comece em casa. Faça de sua casa uma casa da palavra, ou seja, uma biblioteca familiar. Leia. Leia junto com seu filho. Dê tarefas para ele que incluam a leitura de algo. Mais importante: Nunca esqueça da leitura da Bíblia em seu lar. Ela será a marca registrada de uma fé que precisa ser estendida às gerações vindouras (Dt 6.1-25).

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